O jornalista Francisco Borges foi abandonado aos 3 anos no bairro do Pacaembu, zona oeste de São Paulo. Sozinho, aguardou três anos na Febem (atual Fundação Casa) para encontrar uma família.
Nessa nova composição, Francisco experimentou o acolhimento e o amor de uma família grande. Anos mais tarde, decidiu que era a vez de ele acolher crianças que também estavam à espera de uma nova história.

Na época, eram permitidas visitas, mas eu não recebia nenhuma. E eu ficava triste quando isso acontecia. Mas, com a chegada dos meus pais adotivos, tive a oportunidade de chamar alguém de mãe ou de pai, de forma consciente. E de amá-los.
Aprendi o que era um pai, o que era uma mãe, e aprendi a receber carinho e afeto. Fui muito acolhido. Éramos uma família grande, que tinha bastante festa, encontros, muita alegria. E, por ser filho único, sempre tive vontade de continuar com uma família grande. Quando completei 12 anos, minha mãe faleceu. Depois, aos 15, foi meu pai. Foi uma dor muito grande.
‘Disse que ia comprar balas e não voltou’
Minha história com a adoção começou ainda na infância. Minha mãe me deixou no bairro do Pacaembu falando que ia comprar balas e já retornaria, mas não voltou. Fui levado para a antiga Febem (atual Fundação Casa), onde fiquei três anos aguardando a adoção acontecer.
Naquele momento, ainda não tinha ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Pouco se sabia das necessidades da adoção. A Febem reunia todas as crianças e adolescentes do Estado de São Paulo que estavam para adoção ou porque as famílias naquele instante não podiam ficar com eles. Então, era um grande repositório de crianças.

Sempre soube que queria ser pai. Quando eu fosse construir a minha família, queria que fosse grande, repleta de pessoas, de subjetividade, de experiências pessoais. Fui construindo uma consciência do que era adoção e do que isso proporcionava a quem era adotado — porque tinha mudado a minha vida.
Meu primeiro filho veio aos 30 anos, o meu primeiro processo de adoção. Ele era um recém-nascido, o Victor, que hoje tem 15 anos. Com ele aprendi a ser pai, e vi todos os medos que os pais e as mães têm, e todas as experiências de paternidade, de trocar fralda, de alimentar. Escutei ele falar ‘pai’ pela primeira vez, vi seus primeiros passos, mas meu sonho de continuar a minha ‘paternagem’ era grande.
Quando ele completou 10 anos, conversamos sobre a possibilidade de aumentar nossa família — e deixei para que ele pensasse sobre isso, porque eu não queria que fosse uma coisa imposta, queria que ele estivesse contente sobre isso também.
Um tempo mais tarde, dei uma entrada no meu processo para adotar crianças maiores. Já estava consciente de quem eram essas pessoas que estão na fila de adoção, da quantidade de crianças negras, de meninos e meninas que precisam ser retirados desse lugar e ter possibilidade de ter uma família.